Num mundo a olho nu está escondido um planeta microscópico. No meio dos macacos, da selva densa e do rei canguru há um grão com um mundo utópico. Who-ville nem sonha que anda à solta num campo de armadilhas mas tem um novo protector: o gigante e ternurento elefante Horton. Só mesmo uma história de Theodor Seuss Heigel, para os leigos Dr. Seuss, podia rimar assim.
Quando se ouve a expressão «adaptação cinematográfica de um livro de Dr. Seuss» o medo apodera-se de muitos. Não fossem os exemplos de anteriores experiências como Grinch ou Cat in the hat. A verdade é que o universo do autor é tão cheio de detalhes, rimas e maneirismos que é tarefa árdua torná-lo credível fora de um livro. A melodia saltitante de Seuss é um objecto que dificilmente pode deixar de ser só dele.
Com Horton e o mundo dos quem, o mundo de Dr. Seuss mudou de corpo. Passou a ser inteiramente em animação e, com ele, também o potencial imaginativo cresceu em igual quantidade. Adaptado que está pelos realizadores Jimmy Hayward e Steve Martino, Horton é muito mais merecedor de votos do que os seus antecessores sem, contudo, poder chamar-se de senhor perfeito.
Para os que apenas cruzaram o olhar com a figura de um elefante carinhoso e trapalhão à conversa com uma estranha e minúscula criatura, seguem as devidas explicações.
Horton (Jim Carrey) é um elefante, inevitavelmente de memória apurada, que vive numa selva (a de Nool) dominada por um canguru fêmea em vez do conservador leão. Acredita ter descoberto um mundo microscópico num dente-de-leão e quer protegê-lo dos perigos que o mundo à escala normal oferece. No outro mundo, vivem os Who (os «Quem»), seres organizados, que se reproduzem em massa - o Presidente da Câmara com voz do maravilhoso Steve Carell tem 97 filhos.
O desafio do protagonista é fazer com que os seus co-habitantes acreditem que existe um mundo na pequena planta que o elefante carrega e com quem fala. Pelo caminho atribulado, vamos sendo guiados pela voz de um narrador, sempre em rima, bem ao jeito dos escritos de Dr. Seuss.
O filme da 20th Century Fox mostra que, no que à animação diz respeito, há uma aproximação cada vez maior ao nível com que nos deslumbram a Pixar ou a Dreamworks. No decorrer da fita, encontramos cenas deliciosas como aquela em que Horton atravessa uma ponte extremamente instável enquanto, no mundo que carrega, o Presidente da Câmara de Who-Ville se aventura numa consulta no dentista. Ou mesmo aquela em que o desesperado elefante perde o dente-de-leão cor-de-rosa na imensidão de um campo de dentes-de-leão cor-de-rosa.
Não podemos deixar de referir que o defeito dos filmes de animação da 20th Century Fox perdura. Pelo caminho vamo-nos cruzando com personagens secundárias que nos prendem a atenção muito mais do que os protagonistas mas com as quais acabamos por passar muito pouco tempo.
Em a Idade do Gelo e na sua sequela o exemplo mais visível é o de Scrat (o esquilo desenfreado que não larga a bolota). Em Horton há Morton (Seth Rogen), o sidekick do elefante, há o vilão Vlad (Will Arnett), um abutre com sotaque russo, e há Jo-Jo (Jesse McCartney), o rebelde e único filho rapaz do mayor da cidade. Para além disso, a facção da pequena cidade acaba por se tornar mais interessante e fora do baralho do que as lições de moral bem intencionadas e demasiado comuns de Horton.
É o próprio elefante quem repete vezes sem conta a frase «Uma pessoa é uma pessoa, independentemente do tamanho». Estas pessoas de tamanho para ver à lupa revelam-se em Horton e o mundo dos quem bem maiores do que a maior personagem do filme (em tamanho).