Os filmes da família Apatow têm sofrido à grande com os títulos infelizes que lhes oferecem os portugueses. Um belo par...de patins é o pior de todos mas é preciso salientar que a qualidade do título não tem qualquer relação com a excelência do filme. Esse, é para ver.
Não é grande feito dizer que é a estreia da semana numa data em que só estreiam dois filmes mas podia bem fazer frente a muitos dos blockbusters que por aí andam a rondar. Deixo-vos as notas que estão agora publicadas no sítio habitual.
«Dos mesmos produtores de Virgem aos 40 e Um azar do caraças». A marca está registada e já é associada a uma griffe de reinventores que pegou em géneros mais mortos do que uma múmia e os tirou do caixão. Que o infeliz título português (Um belo par…de patins) não afaste o público de Forgetting Sarah Marshall, o filme que a trupe de Judd Apatow se atreveu a chamar de «a primeira comédia romântico-catastrófica». Há piadas, Marretas, musicais e nus embaraçosos. De catástrofe não sobra amostra.
Estamos conversados sobre a fórmula de sucesso que o gangue de Judd Apatow já provou ter em mãos. Pegar em subgéneros da comédia que pareciam não ver a luz ao fundo do túnel e dar-lhes uma nova roupagem carregada de pontos em comum com a vida real parece ser o trunfo para chegar à receita milionária. Um belo par…de patins não foge à regra deste livro de estilo mas, desta vez, tem um realizador estreante a comandar as operações (Nicholas Stoller) e um argumentista que acumula a função de protagonista (Jason Segel) a passar com distinção nos dois testes.
O título em inglês não engana. Do que Peter Bretter, um compositor de música para séries de televisão, precisa é de esquecer Sarah Marshall (Kristen Bell), uma actriz da moda protagonista da série Crime Scene: Scene of the crime (uma paródia aos CSIs desse mundo). A famosa loura viveu na categoria de sua namorada durante alguns anos mas, um belo dia, decidiu trocá-lo pela estrela do rock de sotaque britânico flamboyant Aldous Snow (Russel Brand).
Quando Peter, o eterno fã d’ Os Marretas com o secreto sonho de fazer um musical com bonecos, decide fazer uma lavagem à alma no solarengo Havai, a última coisa que esperava encontrar era a ex com o actual amigo. Mas a tragédia acontece e tudo parece estar condenado ao desastre. Os jantares solitários, os encontros imediatos do terceiro grau com a última pessoa com quem ele gostaria de chocar e as exibições de estrelato do novo namorado são apenas alguns dos episódios que este abandonado em recuperação tem de enfrentar.
Pelo caminho, é fácil percebermos que Judd Apatow fez questão de manter a sua quadrilha por perto com participações dos habituais Paul Rudd, Jonah Hill ou Bill Hader - este último no papel do irmão de Peter que, através de videoconferências online vai tentando guiá-lo na recuperação- e que trouxe algumas novas aquisições como a de Mila Kunis no papel da recepcionista do resort que vai tirar dos eixos o homem mais depressivo daquela colónia de férias.
Podia perguntar-se: mas não será esta apenas mais uma comédia? Podia resumir-se apenas a essa condição, não fosse pelo ar fresco que a equipa que a assina consegue trazer de cada vez que se aventura num novo projecto. As referências ao humor teen estão lá e as inspirações das comédias românticas também marcam presença mas não se esgotam no humor formatado a que estamos habituados visto que, por baixo desses pontos de partida, se escondem personagens com um fundo real e muito mais para oferecer do que piadas de consumo rápido.
Claro que tal facto não invalida que os momentos de humor sejam muito bons (e são, mesmo quando no auge da sua parvoíce). Da troça à obsessão americana por séries de televisão (a inesquecível pancada n’ Os Sopranos) às passagens musicais que tocam o lado nostálgico dos mais imunes (imagine-se um adulto choroso a tocar o eternizado tema do genérico d’Os Marretas ao piano), tudo contribui para que esta mescla de desequilíbrios equilibrados resulte tão bem.
O protagonista e argumentista, Jason Segel, que, aparentemente vai mesmo fazer mais uma adaptação ao cinema d’Os Marretas, tinha criado por carolice um musical do Drácula com bonecos, projecto que acabou por ser trespassado para o personagem e acrescentado ao argumento inicial, culminando num dos melhores momentos da fita.
Um belo par…de patins é tanto um filme de estupidez machista, quanto uma película sobre um genuíno sofrimento decorrente de um desgosto amoroso. E são esses contrastes que o tiram do palheiro e o colocam na linha da frente como uma das potenciais comédias do ano. À la Judd Apatow.